| Materia falando sobre o Marquinhos - o craque do futuro cameponato da NLB (coluna do Giancarlo Giampietro)
Muitos coçaram a barba, desconfiados. O que o garoto tem na cabeça para, depois de brilhante temporada, deixar o basquete europeu e assinar com um time recém-egresso da segunda divisão do basquete paulista? A maioria deve ter pensado, seguindo a lógica de sua carreira, que lá estava de novo o talentoso jogador aprontando mais uma das suas – ele já havia voltado da Itália outras duas vezes, já havia deixado uma equipe no meio dos playoffs do Nacional e também abandonou a seleção brasileira antes de dois torneios importantes, no ano passado. É o que se chama de bagagem.
Marquinhos, porém, parece saber bem o que fazer no interior paulista. Assim como, após uma breve zapeada desta coluna, parecia saber o que queria nos últimos dois anos. As dúvidas, por nossa parte, podem ser restringidas às quatro linhas.
O talentoso e ainda promissor ala está apenas de passagem por São Carlos: que o torcedor aproveite enquanto pode ver ao vivo um atleta de 2,07 m de altura rasgando a quadra com um controle de bola incomum, feito um armador; mais um atleta beneficiado por treinamento europeu, exibindo consciência tática e fundamentos; enfim, um atleta com novo empresário, acompanhado por um técnico americano diariamente, determinado a, na próxima temporada, assinar um contrato com alguma das 30 equipes da NBA.
“Se tivesse ficado na Europa, não teria muito tempo para me preparar para o draft, como aconteceu este ano. Cheguei aos Estados Unidos em cima da hora. Da próxima vez, vai ser diferente”, disse Marquinhos ao Rebote.
O jogador rescindiu seu contrato com o Pesaro (clube com o qual tinha vínculo até 2008) e também cortou seus laços com o escritório Entersport, do agente americano Marc Fleisher (representante de Andrei Kirilenko, Vlade Divac e outros astros). “O Marc parecia muito mais interessado em me manter na Europa, não pensava muito em mim para a NBA”, justificou Marquinhos, agora agenciado por Joe Santos, o braço direito de Nenê.
Não é à toa, então, que São Carlos tenha sido, digamos, escolhida para seu retorno ao Brasil. O pivô do Denver Nuggets tem participação nos investimentos da equipe interiorana – seu tio, Edinho, e seu primeiro técnico, Nivaldo Meneghelli, são alguns dos responsáveis pela condução do projeto.
Em São Carlos, Marquinhos está sob a orientação diária do americano Bob Donewald, que passou três temporadas na NBA como assistente técnico de Charlotte/New Orleans Hornets e Cleveland Cavaliers. Foi demitido dos Cavaliers e começou operar individualmente, na mesma cidade, na academia Speed Strenght, orientando pretendentes ao draft, além de outros atletas como... LeBron James. Foi nesta atividade que conheceu e impressionou Nenê. Chegou até a ser sugerido pelo pivô à CBB, ao lado do scout dos Nuggets Jarinn Akana, como uma possibilidade para a seleção brasileira.
Se Marquinhos está em uma cruzada em busca de espaço no basquete americano, Donewald acredita que ele cumprirá seu objetivo tranqüilamente. “Marcus vai estar na NBA na próxima temporada, não há dúvida pelo que ouço de meus contatos e amigos por lá”, afirmou o treinador. “Talvez precise de um ou dois anos para se adaptar à liga, para poder jogar regularmente, mas é talentoso o suficiente para atuar nas posições 2 e 3 no mais alto nível”.
Embora São Carlos tenha apenas uma vitória no Paulista, Marquinhos vem sendo um dos destaques do campeonato, como era de se esperar: quinto colocado entre os cestinhas (21,5 por jogo), nono entre os reboteiros (7,7), oitavo nas assistências (4,4), oitavo em roubos de bola (2,4), 16° em tocos (0,8) e segundo em tempo de quadra (38min38seg de média). Volume de jogo que não vem de atuações individualistas, heróicas.
Na quarta-feira 27 de setembro, contra o Paulistano, o ala atuou nas posições 1, 2, 3 e 4, começando como ala-pivô (na defesa) em confronto com Ricardo Probst, brigando por rebotes defensivos debaixo, tentando proteger o aro na cobertura aos atletas de perímetro; no ataque atuou no alto do garrafão, fazendo corta-luzes e distribuindo a bola. Durante a partida, assumiu a função de armador no segundo período, por cinco minutos. No segundo tempo, voltou como lateral. No domingo 2 de outubro, contra São Caetano, deve ter desapontado a audiência da ESPN Brasil. Esbanjou versatilidade novamente, participou mais da armação e condução de bola, mas dessa vez com menos efetividade.
Em ambas as partidas, o jogador focou-se em jogar para a equipe, mostrando como um ano de Itália pode influenciar positivamente o ímpeto de um cestinha. Contra o Paulistano, foi tentar seu primeiro arremesso depois de três minutos rodados. O segundo chute veio apenas com cinco minutos. Por muitas vezes, mostrou boa leitura de jogo, viu “atalhos” e serviu seus companheiros, que nem sempre estavam atentos ao passe, ocasionando em alguns erros. O mesmo ocorreu contra São Caetano, quando foram para o intervalo com cerca de 10 pontos de vantagem e chegaram a ampliar a diferença no terceiro período (para, depois, tomar a virada nos últimos cinco minutos de partida, com muitos arremessos de três pontos forçados e nenhuma jogada). Marquinhos também orientou e incentivou seus companheiros durante quase todo o jogo contra o Paulistano. Conteve-se, evitou reclamar de bolas perdidas ou de falhas de comunicação da equipe.
O problema é levar ao extremo esse jogo coletivo e ficar frio na partida. Aí São Carlos paga o pato. Em sua defesa, constata-se que em ambas as partidas seu time esteve perto da vitória. Mas, quando sua equipe precisou, nos momentos derradeiros, a mão não estava lá tão descalibrada. A segunda preocupação decorrente deste comportamento é a tendência do ala a ficar passivo em quadra. Isso a Europa ainda não lhe forçou: Marquinhos ainda precisa se movimentar sem a bola em suas mãos, buscar corta-luzes e não apenas ficar estancado na zona morta à espera do passe. Tem recurso para criar sua própria jogada (habilidade no drible, um primeiro passo veloz, mecânica perfeita no arremesso e envergadura mais do que suficiente), mas seria bom dar uma olhada nas fitas de um Reggie Miller ou de um Rip Hamilton para tentar outros caminhos.
Isso vale para o ataque. Para a defesa, ainda falta muito. Por enquanto, vive de roubadas na linha de passe. Contra Paulistano, no quarto período, abusou de sua agilidade e envergadura para cortar passes laterais em uma zona 2-1-2, iniciando contra-ataques que lhe renderam sete pontos consecutivos. Mas ainda lhe falta intensidade na marcação individual. Um quesito obrigatório para qualquer equipe americana.
No entanto, o fato, hoje, é que Marquinhos está em fase de experimento. Para ele a competição vai valer mesmo em abril de 2006, quando já deverá estar em Cleveland, para tentar mostrar que sua cabeça vai bem, obrigado.
Marquinhos deixou o Corinthians durante o Nacional de 2004 no meio dos playoffs, sim. Mas foi o clube que permitiu a inclusão no contrato de uma cláusula que dizia: “o ala pode partir na hora que quiser”.
Sobre a seleção brasileira: durante os testes para o draft do ano passado, Marquinhos sofreu uma lesão muscular em Utah. O médico da franquia de Salt Lake city afirmou que o brasileiro precisaria ficar um mês parado, sem qualquer atividade física. Na semana seguinte, o lateral se apresentou à seleção brasileira em Campos dos Goytacazes. Poderia disputar o Sul-Ameriano adulto e o Mundial Sub-21. Mas voltou a sentir a lesão nos treinos. Enquanto a CBB afirmou que ele estaria pronto para jogar em cerca de oito dias, um médico particular deu o mesmo diagnóstico do americano.
Marquinhos, então, deixou a seleção – caso agravasse a lesão, teria seu contrato com o Premiata Montegranaro ameaçado. Ouviu antes de ir embora que “não seria convocado mais” caso partisse.
Os azarões de Montegranaro foram à final da segunda divisão italiana, liderados por dois veteranos americanos e por Marquinhos. Na decisão, o brasileiro atuou como armador, em um nível de jogo bem alto. E não foi sondado nem para a pré-lista da Copa América. Não recebeu nenhuma ligação.
Fonte Site Rebote
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