| TV lança caixa com as quatro temporadas do seriado sobre garotos da favela
"Cidade dos Homens" quebra a monotonia do "padrão Globo"
LAURA MATTOS DA REPORTAGEM LOCAL
Vamos direto ao ponto: "Cidade dos Homens" é uma das melhores produções da teledramaturgia brasileira dos últimos tempos. A caixa de DVDs com as quatro temporadas, que sai agora, é uma boa para quem não viu a série na Globo ou assistiu só a alguns episódios. E para os que acompanharam, gostaram e querem ter bons títulos em casa. "Cidade dos Homens" marca a história da TV brasileira por algumas razões. A primeira é ter retratado dramaturgicamente a favela com realismo não-sensacionalista. O morro, o tráfico, as armas, a discriminação, tudo estava lá. Mas as câmeras não eram as jornalísticas da notícia-espetáculo nem as cinematográfica da "cosmética da fome". A favela de "CDH" é "só" -e sobretudo- o lugar onde moram os protagonistas da história, os garotos Laranjinha e Acerola. Programa independente, "CDH" foi também importante por ter mostrado à Globo que há capacidade de produção televisiva além dos muros do Projac. É o que refresca a programação, quebra a seqüência monótona do "padrão Globo de qualidade" e ainda rende bom ibope. "CDH" é uma criação da produtora O2, de Fernando Meirelles. É neta do especial "Palace 2", exibido pela Globo, que serviu de preparo para que o cineasta rodasse o consagrado longa "Cidade de Deus" (2002). O filme e seu sucesso são pais da série da TV. Entre outras ousadias, "CDH" usou em seu último episódio desenho animado, que, aliás, foi um balão de ensaio para o lançamento da série em DVD (vamos lembrar que a O2 é a maior produtora de publicidade do país e que os caras sabem ganhar dinheiro). O capítulo final, dirigido por Meirelles, merece atenção. "Em Algum Lugar do Futuro" é sobre o destino de Laranjinha, Acerola e seus intérpretes, respectivamente, Darlan Cunha e Douglas Silva. Assim como os personagens, os atores são do morro carioca. E Meirelles joga com as intersecções entre realidade e ficção. Darlan e Douglas têm de abandonar a série pois já têm quase 18 anos (tinham 11 quando tudo começou). Decidem tentar uma vaga em outra série da Globo e seguem para o Projac com a atriz e ex-paquita Letícia Spiller. Fazem testes para as duas. Na primeira, não conseguem porque são novos. Na segunda, porque o papel é de filho de casal branco, e eles são negros. "Por que então eles não usam um casal preto?", indaga Darlan. É surpreendente que a Globo tenha veiculado uma porrada tão forte em seu próprio estômago. Os programas fictícios são ridículos, e o episódio ainda satiriza "Faustão" e "Globo Repórter". OK, tudo parece uma brincadeira, mas a acidez está lá, e Fernando Meirelles não nasceu ontem. Se foi descuido ou coragem, não importa. Uma frase do cineasta nos extras do DVD traz uma dica relevante: "Talvez o problema maior na TV seja a autocensura de diretores e autores, que deixam de propor algo com medo de ouvir "não" da cúpula". Cidade dos Homens Distribuição: Som Livre (R$ 79,90; preço sugerido; caixa com quatro DVDs)
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Clima de despedida marca "Enterprise"
SALVADOR NOGUEIRA DA REPORTAGEM LOCAL
Uma temporada descomprometida com os índices de audiência e, por isso mesmo, muito melhor que as anteriores. Esta é a marca do quarto ano de "Jornada nas Estrelas: Enterprise", que sai agora em DVD. Foi a última leva de episódios da franquia iniciada com as aventuras de Kirk e Spock, exatos 40 anos atrás. Quando "Enterprise" chegou ao final de sua terceira temporada, em 2004, a série tinha todos os motivos para ser cancelada pela rede de TV UPN. Mas a Paramount, responsável pela produção, queria pelo menos mais um ano de episódios, para completar a cota exigida para revender o programa para a exibição em reprises. Renegociando os custos por episódio com a UPN, o estúdio conseguiu o que queria, e a quarta temporada viu a luz do dia. Os criadores e produtores-executivos, Rick Berman e Brannon Braga, sabiam que o programa não teria chance de ser renovado e se afastaram da produção. Para orquestrar essa temporada ficou o roteirista Manny Coto -fã da série original. Foi a melhor coisa que poderia ter acontecido. Ao longo daquele ano, Coto estabeleceu uma nova forma de contar histórias, intermediária entre a dos programas fortemente serializados (como "24 Horas") e a dos shows que contam histórias individuais por episódio (como "Lei e Ordem"); pequenos arcos, com dois ou três episódios cada um, completariam as histórias. Outra mudança forte ocorreu nos enredos, que passaram a formar mais ligações com o que se viu na série original, supostamente ambientada 150 anos depois das aventuras do capitão Jonathan Archer e seus comandados, estrelas de "Enterprise". Resultado: um sonho se realizou para os fãs da longa história de "Jornada nas Estrelas". Um arco de três episódios, por exemplo, retrata uma guerra civil em Vulcano, planeta nativo de Spock; outro mostra as primeiras alianças que dariam origem à Federação Unida de Planetas, estimulada pelas intrigas produzidas pelos misteriosos romulanos. Em um episódio duplo, os roteiristas ousam até explicar por que os klingons do original se parecem com os humanos, em vez de possuir a testa protuberante que aparece nas demais produções. (A explicação é o aumento da sofisticação da maquiagem desde os anos 60.) O único senão é o episódio final, escrito por Berman e Braga. Sem querer estragar surpresas, ele mostra como uma boa idéia pode ser estragada, justificar o cancelamento da série e demonstrar o esgotamento criativo da produção. Ainda assim, ele não é motivo para descartar a temporada toda, sobretudo agora, num momento em que os fãs comemoram os 40 anos de "Jornada nas Estrelas". É uma boa oportunidade para deixar o saudosismo tomar conta e relembrar por que a série é cultuada no mundo todo. Jornada nas Estrelas: Enterprise - 4ª Temporada
Distribuidora: Paramount (R$ 160, em média)
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